domingo, 1 de junho de 2014

PRECISAMOS DE BONS LEITORES E BONS ORADORES


Eu sempre incentivei meus alunos, minhas sobrinhas, os filhos e as filhas de amigos a lerem. Acho que isso faz um bem danado para o jovens e pode ajudar a torná-los adultos intelectualmente mais saudáveis. Eu vejo exemplos disso todos os dias. Meus "sobrinhos" e "filhos" emprestados são bons leitores e lêem um pouco de tudo. 

Há aproximadamente uns dois séculos atrás o leitor era o frequentador dos salões de leitura, coisa elitizada que fazia muito sucesso na Europa e uma moda que chega ao Brasil no século XIX. Eram adultos e, em sua maioria, homens. Mas a mulheres também liam, pelo menos algumas. Elas começaram a formar seus clubes de leitura. 

O ato de ler já foi algo desafiador, revolucionário. Liam-se livros proibidos, aqueles que a igreja mandava queimar ou condenava a leitura. Lia-se os iluministas em pleno absolutismo. Lia-se sobre comunismo durante a ditadura militar e durante o Macarthismo, nos Estados Unidos. 

Hoje existe uma verdadeira democratização da leitura. As pessoas podem ter acesso a livros, jornais e revistas tanto pelos meios convencionais (indo a livrarias e bancas) como podem ter acesso a livros digitais, por exemplo, por meio da internet. As escolas recebem livros novos todos os anos. A opções são muitas basta incentivar. A cada dia nascem mais leitores no mundo. E podem nascer ainda mais.

O ato de ler em si é envolto de uma série de significados que foram se transformando de geração em geração. Quando eu era jovem, os leitores eram identificados como sendo os alunos estudiosos, os CDFs (cabeça-de-ferro), depois chamados de nerds. O nerd seria uma pessoa muito dedicada aos estudos, que exercia atividades intelectuais que muitas vezes iam além daquelas que são adequadas para sua faixa etária.

Nerds são identificados em filmes como pessoas pouco populares, fisicamente pouco atraentes, tímidas e solitárias, sendo em alguns casos associadas a leitores de quadrinhos e ficção científica. Esse tipo de caracterização, entretanto, mudou muito nos últimos anos. Hoje nossos nerds são diferentes. Ser inteligente tem deixado de ser "vergonhoso" e muitos jovens vem cada vez mais se identificando com uma nova imagem do nerd e criando tribos que não são nem tímidas e muito menos solitárias.

Eu tive hoje uma amostra disso. Foi assistir a um encontro de sagas organizado por adolescentes e jovens entre 14 e 20 anos de idade. Eu fiquei, como se diz, “na minha", observando, analisando esse grupo nerd repaginado, fãs de Harry Potter, Senhor dos Anéis, Jogos Vorazes e outras séries de livros que se tornaram as chamadas sagas. São uma turma jovem e descontraída onde você pode encontrar um pouco de tudo. Do mais "certinho" com roupas arrumadinhas ao mais descolado e despojado.

Suas atividades são quase brincadeiras de criança. Alguns se vestem como seus ídolos, outros participam de disputas de pergunta e resposta sobre livros (Quiz). Ele brincam com espadas que eles mesmos produzem, reproduzindo lutas ou fazem jogos de "arena" que mais parecem aquela brincadeira de criança chamada de "pique pega". Tudo com muita naturalidade e a gente pode ver que eles se divertem e que não se sentem intimidados com os olhares de pessoas que não entendem a razão de tanta animação.

Todos eles declaram que lêem muito e gostam de seriados de TV. Até aí tudo bem. Mas uma outra coisa me chamou a atenção, algo que me incomodou bastante. Eles lêem muito, mas falam mal. 

Em que sentido? O uso de palavras de baixo calão é recorrente, tanto que eu me senti intimidada e fiquei de boca fechada porque eu não saberia dialogar naquele nível sem me sentir constrangida. Tentaram me explicar que adolescentes se comunicam assim, na base dos palavrões. Claro, eu vejo alunos usando termos inapropriados (não achei outra palavra) todos os dias na sala de aula, mas a quantidade me assustou e mais ainda a naturalidade com que isso acontecia. 

Talvez eu esteja "fora de moda" ou querendo que os grupos de leitura de hoje sejam formais como os de um século atrás. Mas não acho que seja isso. Acho que me assusta o vocabulário agressivo dos jovens. Eu vejo isso como um problema de educação que não é apenas formal, é moral. E sendo moral deve ser um encargo da família. 

A família deve instruir os filhos com relação ao uso de certas palavras. A escola não pode ser responsável por essa parte. É da família a obrigação de dar uma educação moral apropriada a seus filhos desde cedo, a partir de atitudes, de exemplos e corrigindo o menino ou menina quando ele abusa do vocabulário chulo. Essa história de "quando crescer, melhora" é papo furado.

São bons meninos, são bons leitores, mas não são bons oradores, não sabem usar a língua de forma adequada. Veja bem, não estou dizendo que devem usá-la de forma "correta". Isso é muito difícil, poucas pessoas realmente sabem fazê-lo. Falo na adequação. Imagino que usem "palavrões" para se dirigirem a qualquer pessoa em qualquer contexto. E isso é um problema. Um problema sério. 

Eu acho o máximo o que esses meninos fizeram. Acho que devem continuar fazendo esses encontros. A palavra escrita, a leitura, tem poder. Só me entristece ver tantos leitores serem oradores tão ruins. Talvez eu esteja enganada, talvez esteja exagerando, mas fico pensando que estamos falhando ao ignorar essa desintegração do nosso idioma. Não estou censurando o palavrão ou sendo reacionária, longe de mim. Apenas acho que o vocabulário dos nossos jovens deveria ser mais enriquecido e menos banalizado. 

2 comentários:

Jenny Horta disse...

Pois é, este é um problema que não consigo descobrir de onde vem...Meu filho caçula está com 12 anos e esse "aflorar" da adolescência parece ter consumido seu vocabulário! Noutro dia mesmo conversamos exatamente sobre isso: parece que mudam a própria linguagem para se integrar ao grupo. Justo ele que era super elogiado por ter um vocabulário bem acima de sua faixa etária, desde a educação infantil. Mas, como Vigotsky nos diz, aprende-se na interação com o meio...

Gazy Andraus disse...

É questão de valores...estão sendo perdidos, e com isso, palavrões são emitidos como palavras normais. Eu, quando jovem e lia gibis de super-heróis e via filmes sempre me guiava por um falar mais correto e rebuscado, acompanhando a índole e ideários. Apesar desses jovens atuais serem nerds e geeks, os ideários estão desvirtuados. Portanto, palavrões estariam de acordo com essas desvirtualizações.